Houve um tempo em que uma Lei inter-pessoal me restringia quanto ao uso da palavra “amor”. A primeira vista poderia soar estranho, bobo ou até um tanto inútil. Mas era uma forma de respeito ao que de mais romântico poderia haver, de tão raro... “Não citar a palavra em vão”, justamente uma maneira de não banaliza-la. Era certamente por influência direta de uma segunda pessoa que já virou terceira ou quarta.
Numa das minhas leituras aleatórias, desregrada e anarquista, sem ritmo ou técnica, me deparei com versos assim:
(...) “Nunca dissemos a palavra amor. Isso se deslizava, de contrabando, quando dizíamos: “Chove”, ou dizíamos: “Sinto-me bem”, mas eu teria sido capaz de meter-lhe uma bala na memória para que não lembrasse nada de nenhum outro homem”. (...)
Daquele momento da leitura em que os olhos pulam do corpo e tomam outro rumo, vida própria. A gente paralisa a leitura, mas lê mais uma vez, e novamente, e em seguida com voz alta. Depois quer escrever, grudar na parede, recitar... Compreendi e descompreendi um pouco mais também. Mas quantas vezes? Quantas vezes somos capazes de amar sem contar e dizer? De forma anônima, silenciosa? E de que serve isso, se o que o homem mais precisa é de amor? E se o amor é justamente a coisa mais bela e sincera que pode existir na humanidade? E quantas balas, socos, bombas já não tivemos a vontade de atirar em lembranças e memórias?
O fragmento é de “A Moça de Cicatriz no Queixo”, do escritor uruguaio Eduardo Galeano.